Defeitos.

24 de dezembro de 2013

Assim o dicionário define: imperfeição física ou moral; inconveniente. Achei interessante essa última definição, pois tinha em mente apenas a objetividade científica da primeira definição e a subjetividade social da segunda, mas quando vi "inconveniente" não pude parar de pensar nisso. Cheguei à conclusão, mais que óbvia, de que tudo não desejado, mesmo que não tenha defeitos definidos ou indefinidos, aparentes ou escondidos, aceitáveis ou inaceitáveis, será sempre defeituoso, nunca foi querido, até querermos o contrário, então serão mil qualidades que saltam aos olhos incrédulos, um descoberta de algo que sempre estivera ali. Veja como a coisa pode mudar rapidamente quando apenas mudamos de opinião ou abrimos os olhos!
Diante disso, resta dizer que o defeito de um pode ser a mesma qualidade de outro, seja físico ou moral. O que decide isso é a vontade daquele que observa. Até ai tudo bem, mas porque alguns defeitos são considerados mais "defeituosos" do que outros? Hummmm. Senso comum?! Parece que fizemos doutorado em apontar o defeito alheio, de julgar o problema particular do outro, subjugar a simpatia da exceção moral, transformar o defeito físico em algo mais grave que o defeito moral, como se todos nascêssemos com saúde perfeita e assim perdurasse pelo resto da vida.
As qualidades? Pra quê? A única coisa que devemos pensar é o paradoxo que já atormentava Machado de Assis: "Por que coxa, se bonita? Por que bonita, se coxa?". E vamos negando o quanto pudermos que somos assim, só mudam os adjetivos.

O Lapso.

Constatações.

9 de dezembro de 2013

Faço dos livros o meu refúgio. Das pessoas, estou cansado delas, de ver como todas são iguais e como não se reconhecem dessa forma, mesmo observando a tentativa inútil de se diferenciar, sem muito sucesso, apenas algumas máscaras ou capas que servem meramente como adorno. No cerne, somos todos mentirosos dissimulados sem razão para tanto. É um puritanismo sem fim, uma hipocrisia nem tão velada, um enjoo dos mesmos jogos de palavras e das mesmas situações. Não ando por aí defendendo bandeiras aviltantemente, sei que no fim não serei tão coerente com meu próprio agir e com certeza não perceberei o quão ridículo estarei sendo, então retorno para o meu refúgio onde posso encontrar os mais diversos personagens, lá posso julga-los sem culpa, imagina-los da maneira que eu desejar, mesmo tendo as suas características descritas detalhadamente por autores não menos humanos, enfim, eu sou o leitor.

O Lapso

Faça amor, não faça jogo.

21 de novembro de 2013

Ouvi um velhinho dizer:
“Amei a mesma mulher durante 50 anos”.
Pensei no quanto isso era ducaralho,
até que ele disse:
“Queria que ela soubesse disso.”
As vezes as pessoas fazem jogo duro,
porque precisam saber
se os sentimentos do outro são reais.
Pensei no quanto isso era fodido.
Somos apenas caras,
somos estúpidos ás vezes,
muitas vezes.
Quantas vezes,
quis dizer:
“EU GOSTO DE VOCÊ”
e não disse.
Não quero chegar aos 90 anos,
morrer e pensar:
“eu podia ter tentado”
Eu costumava ser mais feliz.
Hoje tá tudo meio “tanto faz”
Vejo homens chamando mulheres para saírem,
e no último minuto desmarcarem.
Apenas para serem
difíceis,
ou tanto faz.
O maior crime do homem
não é despertar o amor de uma mulher
e não amá-la,
é fazê-la se depilar à toa.
Eu tinha uma paquera,
eu mandava mensagem,
e ela demorava sempre 4 dias para responder.
Imagina
se eu fosse aquelas pessoas,
que pensam
que se demorar mais de 5 minutos para responder
já começam a se arrepender
de cada letra que escreveu.
Esses dias,
depois de sei lá quanto tempo,
essa paquera mandou mensagem:
“Estou com saudades”
A pessoa diz sentir sua falta,
mas não demonstra.
Ela espera que você adivinhe
com seus super poderes mentais,
que ela precisa de você.
Eu sabia
que qualquer coisa que eu respondesse,
teria que esperar 4 dias para a resposta.
Então respondi:
“Aproveita o gelo que vai me dar e me traz uma coca gelada”
Se você está cansado de joguinhos,
de tanto faz,
dessas regras bobas,
faça como eu,
demita-se.
Sabe,
esqueca essa teoria de não dar moral.
Se quer ligar,
liga.
Vai lá,
tente a sorte,
quebre a cara,
arrisque.
Sabe,
pensar duas vezes
é à distância entre os que sonham
e os que vivem.
Então,
viva.
Saí fora dessa bolha
felicidade não é mercadoria,
não é um remédio que se fabrica,
com fórmula errada ainda,
de indiferença,
cara feia,
e nariz empinado.
Não tem graça
ter essa vida,
onde você tem que esconder
seus sentimentos
por que alguns,
falam que isso é o seu  valor.
Muita idiotice.
Limitar-se já é um problema,
limitar o sentimento é o pior deles.
Perdemos a chance
de viver uma história
pelo simples fato de não falar.
Eu agora,
me apaixono por mulheres que,
além de gostarem de Pearl Jam,
aceleram meu coração.
Eu agora,
me apaixono por mulheres
diretas e honestas.
Que não fazem jogos,
fazem amor.
Quero conquistar uma mulher
sendo eu mesmo.
Sem estereótipos,
sem medo.
Eu agora,
passei a ver o mundo de outra maneira.
E não foi ele que mudou,
fui eu.


Escrito por Ique Carvalho:
http://www.thebrocode.com.br/artigo-196-faca-amor-nao-faca-jogo/

A busca por não ser mais um entre todos.

15 de novembro de 2013

Fica com a sua necessidade de mostrar o saber maculado com a soberba, que eu fico com a minha vontade pragmática de querer viver o que tenho hoje, já que não posso mudar o ontem ou prever as certezas do amanhã. Fica com suas crenças do senso comum, que lhe faz ser essa contradição personificada, que eu fico com a minha criticidade em excesso. O conteúdo cheio nem sempre é sinônimo de algo bom. Os caminhos, e as necessidades que emergem deles, é que ditam qual conteúdo precisamos. De que adianta estarmos cheios e vivermos vazios? O tempo é cruel com todos, está sendo conosco, mas consigo colocar os pontos e vírgulas quando necessário e hoje te transformo em ponto e vírgula. Um coisa, e a palavra coisa serve muito bem para não definir nada, que prefiro não ser é mais um, mas dentro da transformação de alguém em ninguém. Por hora passara a ser somente outro nome qualquer de uma das listas que permeiam minha rotina. Entraste na estatística e engrossaste o modo de vida que tanto critica com sua empáfia. Sim, é com críticas humildes que se constrói, e não com diálogos inúteis e intermináveis regados a uma linguagem segregadora e terminologias das mais cultas possíveis, porém ininteligíveis em sua concatenação de ideias. Importante lembrar que manter a língua intocada e presa é imobilismo intelectual, mas não me espanta que você negue veementemente esse ar que carrega dentro de si. Desejo mais vida e mais coerência, mas antes apague a luz quando sair. Hoje sou só mais um.

O Lapso.

Aborto

13 de outubro de 2013

É possível abortar depois de nascer pronto, acabado e único? Sim, nasceu pronto para ser. Depois de toda uma concepção, de sonhos, do respiro e sinais vitais, pulsava em vermelho vivo. Mas nunca foi e a probabilidade de ser o que nasceu para ser é quase nula, só um milagre o salvará, e foi assim: ponto.

O Lapso

Ligo ou desligo?

8 de outubro de 2013

Vi uma crítica feita pelo site KibeLoco na qual em cima da notícia "Brasil tem tarifa de celular mais cara do mundo, diz estudo." foi feito o seguinte trocadilho: "Sabe porque o Brasil tem a tarifa de celular mais cara do mundo? Porque vive ligando o foda-se.". Depois de ler fiquei algum tempo pensando no "foda-se". O que é o foda-se? Nada mais é do que a versão masculina (sem limites ou restrições de uso) do "Tô nem ai" afeminado de composição da cantora (?) Luka com o Latino (já deu para perceber o porquê de não ser tão usado como o fdse). Não sei porque escrevi isso, haja vista que não tem relevância nenhuma, mas o que interessa mesmo é saber se a sociedade liga o foda-se ou não. A primeira pergunta a ser feita é: você liga o foda-se? Caso a resposta seja positiva (caso seja negativa, reveja seus conceitos), não fique triste, você com certeza não está sozinho e, por enquanto, não está do lado negro da força, ou seja, ainda há uma salvação. A segunda pergunta a ser feita é: o foda-se é social ou individual? Se for social, ou seja, o foda-se que envolve uma questão que possa gerar consequências além do ego, sim, você é um daqueles que se fodem sem saber ou até mesmo sabendo (não sei qual o pior). Se as consequências não ultrapassam o ego, é um foda-se individual que pode atingir o ego para bem ou para o mal. Sabendo usar, faz um bem incomensurável e, como dito anteriormente, sem limites ou restrições. Eu ligo o foda-se, faço isso diariamente, para algumas situações ou para pessoas.

O Lapso.

SQN

1 de outubro de 2013

Mais uma moda lançada nas redes sociais que se prolifera como uma praga. Ninguém me tira da cabeça que o poder de interpretação das pessoas está se esvaindo com o excesso do uso das redes sociais, o que faz com que ninguém conheça ninguém de fato, mas apenas o cotidiano das suas vidas patéticas, muitas vezes divulgadas não com a intenção de difundir felicidade, mas apenas causar inveja, bem como com a falta de boas leituras, o que se faz com uma filtragem de todo tipo de informação a que somos bombardeados constantemente. A nova regra é: quando for irônico, coloque um "-sqn" - expressão que significa "Só Que Não". - no final da frase, para a pessoa ter certeza de que se trata de uma ironia. Perdemos a capacidade de questionar? Se um professor afirma algo, é verdadeiro só pelo fato dele ser professor? E as nossas convicções pessoais? Ou será que o mundo é tão louco que não existe mais razão em simples ironias? Afinal, tudo pode acontecer, até o mais improvável,  não é mesmo?! Será?

O Lapso.

"Somos jogados aqui; vidas já existem; sabemos que a qualquer momento não existirão, e você só tem que seguir o fluxo, instintivamente ir, até o corpo aguentar." - Nat Bespaloff 

Tortuoso.

24 de setembro de 2013

Agora entendo a indignação de algumas pessoas, apesar de ainda não estar convencido e dar razão a elas, mas realmente entendo o motivo de revolta. É fácil crucificar quem se rende às hipocrisias e amoralidades, mas nem todo mundo entende que o ser humano é falho por natureza. Nem tudo é uma questão de valores, somos uma incógnita em constante mudança. Difícil, não!? Como um ímã que puxa ou é puxado, assim age a facilidade, ninguém quer ir pelo caminho mais tortuoso, a busca é sempre pelo objetivismo sem consequências, mesmo que usemos da nossa hipocrisia para dizer que é natural. Natural é errar. Querer errar não é mais natural. Até aqui consigo sentir a revolta daqueles que crucificam, mas ainda não dou razão e não consigo ser convencido de que há razão nisso tudo. Hoje em dia tudo é "liga o foda-se" e o desprezo, então porque não ligar também? Por que não? Ir pelo caminho tortuoso é se revoltar, indignar-se, se tornar um chato, crítico demais, é perder o brilho da felicidade fácil e estereotipada, é receber no peito e digerir do jeito que vier. Prefiro o tortuoso com o "foda-se" pontual, porque nem eu sou de ferro e me permito o fácil às vezes.

Dentro de nós há uma coisa que não tem nome. Essa coisa é o que somos. [José Saramago – Ensaio sobre a Cegueira]

O Lapso

Politicamente Correto.

11 de setembro de 2013

Já cansei de pensar, pensar e pensar. Até para abrir a boca para assobiar eu tenho que ter cuidado com o que assobio. A moda da vez é o politicamente correto. Não se pode fazer ou falar mais nada que alguém se sentirá ofendido. Se a novela da Globo coloca a imagem de um médico que supostamente não existe na realidade, imediatamente sofre retaliações da classe de médicos. Se um comediante solta a frase "comeria ela e o bebê" no tom claro de piada, é logo taxado de escroto inescrupuloso e ainda por cima maníaco. Se o grupo Portadosfundos coloca um vídeo no Youtube sobre Jesus, logo aparecem os religiosos fanáticos exigindo sua retirada. São tantos exemplos que a lista seria muito longa e não faltaria assunto puxando assunto. É fácil esquecer que o primeiro caso se trata de uma estória (narrativa de FICÇÃO), que se não agrada basta parar de assistir, no segundo e terceiro casos trata-se de humor escrachado (foi sem graça os dois, assumo, mas ainda é humor para alguns e respeito isso). Claro que não estou colocando o humor e as estórias acima da moral e da ética, deixando ambos sem qualquer limite, mas o que tem de se levar em consideração é o "dolo" da situação.
O politicamente correto vem se impregnando não somente na linguagem, obviamente, mas lembro como se fosse hoje o dia em que li que chamar alguém de preto, negro, moreninho e outras tantas denominações era errado e que o correto seria afrodescendente. Até a palavra afrodescendente usada de forma pejorativa pode ofender. A linha que divide a ofensa do uso comum (que um dia foi impregnado pelo racismo histórico, mas que hoje não tem a mesma conotação em todos os casos) é muito tênue. Chegar para um amigo e falar "tudo bem, viado?" não é a mesma coisa de falar "você é viado" ou que dizer "oi, meu gordo" não é a mesma coisa de "seu gordo". Óbvio que não estou falando que reafirmar ou reforçar estereótipos preconceituosos seja saudável para a sociedade, mas ao se impedir de expressar sobre o assunto, nas mais diversas formas, escrachada ou sutil (acreditem, o sutil é pior), acaba trazendo uma delicadeza desnecessária. Falar de assuntos delicados se torna ainda mais delicado quando começamos a apontar vítimas para tudo ao invés de tratarmos o assunto com serenidade e respeito principalmente, tanto às minorias quanto as maiorias, ambas pensantes.
Se ler Monteiro Lobato me fizesse uma pessoa pior ou melhor, com certeza não seria pelo o que li, e sim a forma como interpretei o que foi lido, e não adianta trazer uma cartilha informando qual é a interpretação correta a ser feita.
O discurso do politicamente correto é típico das minorias, mas não exclusivo, e tornar-se minoria oprimida agora é vantajoso, vide o caso da pessoa que resolveu se fingir de índio para garantir algumas benesses.
A vanguarda do politicamente correto nunca descansa, é preciso ter cuidado até com o que pensamos mas não exprimimos. Se continuar do jeito que vai, acabaremos censurando até princípio de pensamento. De que adianta podar o pensar, se continuamos sendo manipulados pelo não agir?

O Lapso

São Tulipas.

23 de agosto de 2013

Faz alguns anos que não me sentia assim, mesmo não criando expectativas não pude deixar de imaginar, e a minha imaginação consegue ir tão longe quanto qualquer expectativa que eu poderia criar. Um simples e longo suspiro de um tudo bom que poderia ser.
Tive suas mãos em minhas mãos, mas enquanto para você era só o carinho do toque usual, para mim era poder sentir você, mesmo que por um ou dois segundos, fiz deles o par de segundos mais demorados que já vivi só para lembrar daquele momento de ternura. Era você ao meu lado, sua presença inconfundível me deixava mais do que feliz naquele momento, me deixava completamente desconcertado, era um bobo qualquer que estava perdido frente a uma mulher decidida. Era o seu cheiro que aguçava a minha vontade, quase incontrolável, de te beijar, seus lábios mexiam numa delicadeza que só o toque deles nos meus seriam capazes de parar o tempo. Era o seu sorriso, encantador, era o seu humor, contagiante, sua forma de falar, sempre segura, sua maneira de tentar controlar a franja, maldita franja, que lhe fez, mesmo que sem querer, fazer com que eu me apaixonasse por você, foi tão rápido que não pude criar barreiras ou proteções, quando percebi já tinha sido tomado por inteiro. Por fim, era o seu olhar, meigo, aquele que já sabia o que se passava do outro lado, que me hipnotizava, era de uma beleza rara onde eu mergulhava sem palavras.
Mas as tulipas não eram vermelhas, elas eram amarelas desde o início, e eu já sabia disso, não foi por falta de aviso seu, não tenho para quem reclamar ou recorrer, só me resta pensar em você, naquele vestido branco, se despedindo de mim como se nunca mais fosse me ver novamente, e se naquele instante eu morri, foi só para poder sorrir ao escrever isso para ti e sonhar, quem sabe um dia os meus sonhos não se encontrem com os seus em qualquer esquina de coincidência.

"Você que inventou a tristeza
Ora, tenha a fineza
De desinventar"

Barraca de Pastel

19 de agosto de 2013

Texto retirado do site:
http://papodehomem.com.br/a-minha-vida-amorosa-e-uma-barraca-de-pastel/

A gente sempre junta um grupinho e vai lá aproveitar essa proximidade com uma das fragucias mais paulistanas: o pastel. É uma delícia barata e disputada. Quando chega perto de meio-dia, as barracas cheirando a fritura e aconchego ficam abarrotadas, completamente cercadas de pessoas famintas por um pouco de carne com queijo e atenção. Mais afastado, quase no outro quarteirão, há uma barraca que vende o melhor pastel e, também, o mais barato.
Uma beleza só. Tem brinde da nossa escolha, há a facilidade de pagar com cartão de débito, uma meia dúzia de mulheres — que se misturam entre nipônicas e galegas das mais variadas idades — prontas para atender e anotar os pedidos. Mas é muita gente. É muito pedido. Disputado.
Eu chego e tento fazer meu pedido. Todas correndo. Eu levanto o braço, uma delas me nota, mas vira de costas para a cestinha onde os pastéis prontos ficam descansando e secando o óleo. Espero um pouco, dou uma zanzada. Já obtive o contato visual de uma delas. Nesse momento, ela se torna a minha preferida, a menina que mais quero atenção naquele preciso momento. Giro pela barraca e tento pedir de novo para ela. A danada me dá uma nova olhada e balança a cabeça de um jeito estranho, uma mistura de afirmação e desdém.
Mas eu sei que ela está pensando em mim.
Tento ser positivo. Ela disse que já vai me atender. A menina vai para o outro lado da barraca e atende outra pessoa. Pega um chumaço de papéis e anota vários sabores, cada um deles em um pedaço de papel que, logo depois, servirá de embrulho para os pastéis quentinhos e sortidos.
Quando ela se aproxima, eu tento chamá-la com certa ternura e discrição. Não quero parecer afobado, um maluco a berrar por salgados fritos no meio da multidão. Quando tento, ainda com carinho, encostar meus dedos em seu ombro para que a atenção dela se volte por completo na minha direção, ela se abaixa para pegar algum refrigerante ou sacolinha para outro cliente. Mais uma vez se afasta.
Lá, do outro lado da barraquinha de pastéis, ela sorri para alguém, joga alguma conversinha fora e dá uma gargalhada apressada enquanto enfia pastéis em sacolinhas de papel. Imagino que ela não queira falar comigo, mas tento afastar esse tipo de pensamento e focar na minha confiança de que eu posso, de que eu consigo.
Só que, com o passar dos minutos, percebo que ela evita trombar os olhinhos dela com os meus e, mais ainda, ela se poupa de ter que ir até a ponta da barraquinha em que eu me encontro. Ela me evita. E eu só queria me apresentar e mostrar que eu sou, sim, um cara legal e que posso muito bem ser digno de comer os pastéis dela.
Mas ela não me dá bola, cada vez se afasta mais.
Em certo momento, meus olhos focam o que estava na minha frente. Era outra das atendentes da barraca. Ela me perguntou diretamente se eu já havia feito o meu pedido.
Eu volto a olhar o canto oposto da barraca, a menina lá, atendendo outras pessoas, sendo feliz e ágil com o trabalho dela. Ela nunca seria a minha atendente naquela sexta-feira. Eu faço o meu pedido, recebo os meus pastéis e volto para o QG, ainda na hora do almoço.
Eu, sozinho, e uma sacola cheia de pastéis e amargura.
A minha vida amorosa é uma barraca de pastel.

Jader Pires

Mais do mesmo

24 de julho de 2013

Primeiro pensei em escrever um poema, depois lembrei que não sou bom em escrever poemas.
Depois pensei em compor uma música, então lembrei que não entendo nada de composição.
Gastei horas pensando no que poderia fazer, no que poderia dizer, quais sonhos ainda poderiam ser reais e fiquei observando o tempo passar. Ele foi passando, às vezes devagar demais, às vezes rápido demais, e de vez em quando no tic-tac do melhor compasso. Só eu sei todas as intempéries pelas quais passei. As experiências que vivi e principalmente as fogueiras que pulei.
Tudo isso apenas observando, mas não de longe. Vivendo. Sempre querendo entender e deixando encaixar mais uma peça do quebra-cabeça, naturalmente.
Sem inventar delírios, fantasias ou histórias esdrúxulas. Sem distorcer, enganar ou macular quaisquer das verdades, sejam elas minhas ou de outrem.
Nada mais natural do que observar (e repudiar) coisas que lhe parecem diferentes, mas que na verdade é sempre mais do mesmo. Das mesmas maneiras que somos obrigados a agir, educados e viciados. Vejo rótulos que possuem a capacidade de crítica. Olha que paradoxal!
Vejo pessoas que ainda não saíram do ovo. Já passou da hora de se tornar criança.
Tenho que viver com isso. São só mais fogueiras, experiências e tudo mais.
No fim das contas percebi que sou um bom observador, só, não muda nada.

O Lapso

Só rir.

30 de março de 2013

A felicidade está aqui, bem pertinho de nós, não se engane. Só depois da verdadeira dor que se pode dar valor a verdadeira felicidade. Hoje é só isso. Sorrir.

O Lapso.

Aperto e Aprendo

24 de março de 2013

É tão difícil suportar a saudade, ainda mais quando sabemos que é uma saudade só de coisas boas. É um aperto no peito que se traduz na falta que a pessoa faz ou dos momentos bons que ficaram na memoria com um gostinho de quero mais. Ao mesmo tempo é tão bom falar disso com uma leveza de uma brisa de outono. Mas de que adianta sentir saudade? Às vezes duas muralhas sólidas e duradouras se erguem em tempo recorde e entre elas um vazio que congela até o último fio de cabelo.
Os ventos que sopram de lá só trazem notícias que surpreendem, ao passo que confirmam o que já se sabia que aconteceria, contraditório por tudo que se acreditava ter vivido. Entre uma página ou outra dos vários livros que li, entre um ano e outro dentro dos meus vinte e quatro anos, nada disso ensina como viver o que virá. É assim que eu prefiro, aprender cada detalhe com a minha própria percepção a cada escolha, mesmo que está última não tenha sido feita por mim ou que ainda feita por mim seja a errada, o que não a deixa fora do conceito de escolha. Se querem a verdade, ainda não aprendi a lidar com a raiva, e a dor na alma se prolifera como um vírus indestrutível, é uma mágoa só, é um aperto e tanto, mas um dia aprendo, um dia ainda hei de aprender.


O Lapso

(escrito em abril/2012)

Delíquio

É tão difícil entender algumas coisas. Atire a primeira pedra aquele que não procura respostas, não qualquer uma, mas aquela capaz de se encaixar perfeitamente dentro de uma trama lógica e racional. Algumas coisas se encaixam desde o princípio, mesmo que por dedução, mas outras demoram tanto que acabam gerando um desconforto. Talvez ninguém saiba responder às perguntas mais importantes, aquelas capazes de mostrar tudo que esteve oculto. Como um pintor que joga as cores na tela para depois moldá-la em sua verdade e só então acreditar friamente nela, traz a tona toda sua arte oculta. A verdade é que, enquanto tudo não for esclarecido, há várias verdades. Cada um acredita na que lhe for mais conveniente, na que lhe garanta o maior nível de conforto. Eu reluto para acreditar no que vejo e no que ouço, sempre acho que existe alguma explicação plausível, sempre desconhecida, mesmo que psicológica, sei lá, já vi tanta coisa que um pouco de falta de valores não surpreende esse grosseirão que vos fala. Berço de ouro não garante valores probos, é só nisso que eu consigo pensar agora.

O Lapso.

(texto publicado em 18 de abril de 2012, foi apagado e agora volta)

Caetaneando

28 de fevereiro de 2013

Já dizia Caê: "Cada um sabe a dor / e a delícia / de ser o que é...". Mal sabia ele, ao compor sua música "Dom de Iludir", que essa frase ecoaria repetidamente pelo imaginário de milhares de pessoas, até virar frase de facebook e ser "curtida" como se soubéssemos, à primeira vista em qualquer espelho, quem somos.
Tantos que se rotulam e não sentem dor, ao contrário, se deliciam pelo que não são. E nunca serão. É um tanto quanto paradoxal, já que a ideia é se deliciar pelo que somos e de fato é possível se deliciar com um erro, voltando a parafrasear Caê: "Você diz a verdade / e a verdade é seu dom / de iludir".
Somos um emaranhado de pensamentos que mudam constantemente. Somos uma bagunça, organizada naquele momento preciso. Vivermos de rótulos e julgamentos é como isolar-se. Todos, sem exceção, serão crucificados em algum momento, não somos passos certos e firmes o tempo inteiro. Sem perceber vamos errando e errando, mas sabemos do nosso erro e da dor de errar. Não da delicia de errar iludindo-se. Cada um sabe a dor e a delícia de não ser o que quer...

O Lapso.